quinta-feira, 15 de novembro de 2012

O homem, a cabra e a ignorância




Algumas considerações sobre o artigo "Parada gay, cabra e espinafre", de J.R. Guzzo, publicado em "Veja" desta semana:

- De fato, como o referido artigo menciona, na "comunidade gay" há milhares de interesses diversos. Assim como existem milhares de interesses diversos dentro de partidos políticos, associações de classe, sindicatos - inclusive o dos jornalistas -, governos, entidades etc. Contudo, quando lutam por seus interesses básicos, todos esses grupos se unem em aspectos comuns de suas classes e suas lutas. Usando como exemplos grupos associados por raça e gênero, a mobilização dos negros permitiu a aprovação de leis contra o racismo, e a mobilização das mulheres permitiu a aprovação de leis contra o abuso e as agressões físicas. Portanto, diferente do que o texto menciona, existe, sim, um "movimento gay", que luta por direitos básicos do grupo LGBT - que, como mostra a própria sigla, é diverso, mas tem objetivos básicos comuns. Difícil entender a diversidade dentro da unidade?

- De fato, há milhares de assassinatos no Brasil todos os anos, por diversos motivos. Entretanto, não me parece sensato igualar o assassinato de alguém porque "é homossexual" com o assassinato de alguém por algum motivo capital. Os fatores motivacionais são diferentes: "ser" e "ter". Fosse assim, não seria necessário  distinguir o que a Ku Klux Klan fazia com os negros na primeira metade do século XX nos EUA. Afinal, eram apenas "cidadãos 'americanos' assassinados como tantos outros". Difícil entender a história?

- De fato, há exageros no discurso do grupo LGBT, assim como houve - e talvez ainda haja - nos discursos dos grupos ditos "minoritários" - negros, mulheres, imigrantes, judeus, muçulmanos etc.. Nem tudo de fato é homofobia, como nem tudo de fato é racismo. Mas quem sofre a dor é que sabe o que lhe dói. O agressor dificilmente tem a noção da dor que provocou. Já fiz vários comentários e piadas nos meus 40 anos que nunca pensei que teriam magoado - mas magoaram. Assim como tenho ouvido comentários e piadas de pessoas que certamente não queriam me agredir - mas agrediram. Por isso, tipificar o que é ou não homofobia facilitaria, inclusive, a vida de quem "não quer agredir, mas agride". Difícil entender a dor?

- De fato, ninguém é obrigado a gostar de ninguém. Eu, por exemplo, não gostei do artigo do sr. J.R. Guzzo - e pelo seu teor, talvez não gostaria de conhecer o sr. J.R. Guzzo pessoalmente ou sequer trocar palavras além do que a boa educação exige. E certamente algumas pessoas que vão ler este texto não vão gostar do que estão lendo. Também não gosto de muitas pessoas por seu caráter, suas posturas diante dos outros, por suas ações. Mas NUNCA deixo de gostar de alguém porque é "negro", é "mulher", é "judeu", é "muçulmano", é "heterossexual". Portanto, não é possível admitir que alguém não goste de outra simplesmente porque é "homossexual". Ah, e de fato ninguém é obrigado a gostar de espinafre, como dito no texto, "assim como ninguém é obrigado a gostar de homossexuais", como o artigo compara. Mas, para não gostar de espinafre, em tese você deve experimentá-lo. Não me parece que é o mesmo fator motivacional que faz com que alguém diga que "não gosta de homossexuais". Difícil entender a diferença entre vegetais e gente?

- De fato, há limitações para doações de sangue, como o artigo cita. Pessoas acima de determinada idade, que tiveram determinadas doenças etc.. Entretanto, a inclusão dos homossexuais nessa lista diz respeito a uma única palavra: AIDS. Afinal, ela surgiu nos anos 80 e logo foi chamada "peste gay". Até que a doença descobriu milhões de "heterossexuais" convictos que tinham vida dupla. E a "peste gay" virou "mal da humanidade" em geral há bastante tempo. Portanto, não se justifica impedir homossexuais de serem doadores de sangue, desde que seu sangue seja testado contra todas as doenças que podem causar mal aos receptores desse sangue, como se faz com "heterossexuais". Difícil entender a evolução histórica?

- De fato, vários homossexuais foram jogados à fogueira na Europa do feudalismo e do Renascimento. Entretanto, uma rápida leitura de "História da Sexualidade volume 1", de Michel Foucault, mostra claramente o que ocorria naquela época e o que passou a ocorrer a partir do fim do século XIX. Naquela época, cometer atos sodomitas e adultério equivaliam ao mesmo crime. Ambos pecavam contra os direitos civil e canônico da época. A partir do século XIX, porém, a homossexualidade entra em processo de "biologização" e "psiquialização". Como diz Foucault, "os homossexuais passam a ser uma espécie", passíveis de tratamento, de criminalização. Essas barbaridades, segundo o artigo do sr. J.R. Guzzo, foram eliminadas "pelo avanço natural das sociedades no caminho da liberdade" - uma visão etnocentrista, eurocêntrica e naturalizadora do autor em relação às sociedades, como se elas vivessem uma "evolução constante" a caminho da "civilização europeia", visão esta compatível com os etnologistas e antropólogos do século XIX e que já foi abolida há tempos entre os etnógrafos e antropólogos dos séculos XX e XXI, justamente por sua concepção preconceituosa, subjetiva e emoldurada por discursos de poder. Ao contrário do que faz crer o artigo do sr. J.R. Guzzo, essas barbaridades foram, sim, eliminadas - nem todas, diga-se de passagem - com a mobilização dos homossexuais. Lembremos a revolta de homossexuais contra a ação repressiva da polícia no bar Stonewall Inn, em Nova York, em 28 de junho de 1969, ou seja, há menos de 50 anos, e em plena era do limiar da contracultura, pós Primavera de 1968, da cultura hippie, do flower power. Difícil associar o nome à pessoa?

- De fato, um homem não pode se casar com uma cabra, ainda que possa ter uma relação estável com ela, como o referido artigo menciona. Por isso, justifica o autor, um homem não pode se casar com outro homem, ou uma mulher com outra mulher, porque o casamento, "por lei, é a união entre um homem e uma mulher. (...) Pessoas do mesmo sexo (...) podem apresentar-se na sociedade como casados, celebrar bodas em público e manter uma vida matrimonial. Mas a sua ligação não é um casamento - não gera filhos, nem uma família, nem laços de parentesco". Usando a premissa do sr. J.R. Guzzo, pode-se concluir que um homem e uma mulher que não geram filhos não podem ser considerados casados - ainda que eles adotem um filho, pois, afinal, não o "geraram". E se não têm filhos, também não criam laços de parentesco. E, portanto, também não são uma família. Ou seja, na visão do autor, um homem com um homem, e uma mulher com uma mulher, ainda que adotem e criem filhos juntos, registre-os em seus nomes, vivam na mesma casa, unam suas rendas, adquiram bens conjuntos e, caso a relação acabe, se separem, não têm direito a um casamento legal, somente a uma "união estável", que não dá os mesmos direitos que o casamento legal. Difícil entender que homossexuais pagam os mesmos impostos que os heterossexuais e, portanto, o Estado tem o dever de lhe garantir os mesmos direitos?

- Por fim, retorno ao exemplo da cabra. De fato, um homem não pode se casar com uma cabra, ainda que possa ter uma relação estável com ela. E pelo teor do artigo publicado em "Veja", é possível confirmar a premissa da relação estável entre um homem e uma cabra. Provavelmente essa relação estável rendeu como fruto o próprio articulista, que demonstra total ignorância sobre um tema o qual não domina, além de mostrar seu desconhecimento sobre história, filosofia, antropologia, direito civil, direito penal e direitos humanos. Entretanto, o referido articulista é, como eu, jornalista, e as boas regras do jornalismo ditam que devemos tratar apenas do que sabemos. Para tratar com tanta propriedade da relação estável entre homem e cabra, o sr. J.R. Guzzo provavelmente entende do tema. Sua mãe deve estar orgulhosa.





domingo, 8 de abril de 2012

A volta



Eu vi da janela
Eu vi
Vi seu vazio
Seu beijo vadio

Vi o vizinho pelado
O gato alado
A planta e o churrasco
Meu vício e seu asco
Eu vi

Da janela vi eu
Eu doido doído
Automartírio
Ferindo seu vício
Seu vício de si

Eu vi...

Vi que se foi
Vi o que fui
Vi o que vem
Vi o que não vi
Mas eu, sim, eu eu eu eu vi

Vi ausência
Incompetência
Seu título sem texto
Ataque sem contexto
Sim, sim, sim, eu vi vi

Vivi e morri
Eu, cheio de si
Você, cheiro de
Capim eu, você
Vazio de nada,
Eu palavra calada,
Você repleto,
Eu incompleto,
Você um feto,
Eu aborto,
A la Drummond: stop, o tempo parou, ou foi automóvel?
Ou fomos nós?
Nós?
Nós?
Nós
Nós
Ó
Ó
Ó. Fim.
Rio de Janeiro, 8 de abril de 2012.

domingo, 17 de outubro de 2010

Viver é simples




"Só bebo aos sábados e domingos, senão desregula tudo", diz Alexandre, sentado na mesa daquele barzinho pé-sujo numa quase esquina de Copacabana. Como quem não quer nada, ele fica ali, sentado, observando o ir e vir dos personagens que circulam livremente por esse bairro. Uns discretos, quase imperceptíveis, outros espalhafatosos, do tipo que estrearam em vez de nascerem. Todos de sexos variados e alguns até de sexo desconhecido - pelo menos oficiosamente.
Alexandre fica ali, na dele, batendo papo com um ou outro conhecido que pinta no boteco - ao contrário do que se pensa, em Copacabana as pessoas se relacionam como num bom subúrbio. E às vezes tão invasivas e aconselhadoras como em qualquer esquina suburbana. E Alexandre, claro, embora fique na dele, "pega amizade fácil": fala uma palavra ali, outra aqui, vai entrando no papo, mesmo que nem sempre seja chamado.
Sentado, Alexandre fala. Não, não é falar pelo falar. Ele entra nos papos. Participa. Dá opiniões. "Poxa, vão ficar discutindo política? Isso não vale a pena, eles não estão nem aí pra gente", sentencia. É a clássica sabedoria de botequim. Às vezes alguém o escuta. Na maioria das vezes, não: quando a paixão invade as conversas, não há sensatez que a destrua. É o lado bom - e ruim - da paixão: sem meio termo.
Enquanto isso, o copo de cerveja vai ficando vazio. Alexandre o enche de novo, afinal, o fim de semana está acabando e a partir de segunda, nada de álcool! É preciso se cuidar... e o álcool desequilibra não só o pensamento, como sobretudo o corpo. Sobretudo o corpo de Alexandre, que não é frágil, mas é especial.
Alexandre tem 30 e poucos anos. E muitas dúvidas no olhar. Mas vai seguindo sua vida. Com todas as incertezas que cercam seu futuro, ainda assim vive sua vida. Vai e volta com desenvoltura. Toma conta de si mesmo. Dorme e acorda sabendo que vale um dia de cada vez.
Alexandre é meu xará. Tem síndrome de Down. E todos os fins de semana está ali, naquele botequinho, tomando sua cerveja gelada com sua mãe. Foi ali, tomando cerveja, que eu o conheci. E conversamos bastante. Ele, inclusive, me deu conselhos no dia em que discuti ásperamente por causa de política - foi no primeiro turno da eleição. Semeou sabedoria e tranquilidade. Sem, claro, deixar de tomar sua cerva, porque, afinal, todos nós, sem mais nem menos, sãos ou nem tanto, somos filhos de Deus. Acreditando ou não nele.

Crise? Que crise? AAAAAAAAAAARRRRRRGGGGHHHH!

Certo, já ouvi falar zilhões de vezes que todo homem, quando vai se aproximando dos 40, questiona TUDO e TODOS, quer mudar de vida, de emprego, de sexo, fazer voo livre, rapel, descer corredeiras, trepar pulando numa perna só, etc, etc, etc. E do alto dos meus 38 e 4 meses, me vejo cada vez mais encaixado nesse "perfil científico": questiono tudo e mais um pouco, buscando respostas que, claro, não vão aparecer. Porque sequer sei fazer as perguntas direito.
Isso se torna ainda mais grave quando se trata de um geminiano se aproximando dos 40. E apesar de meu ascendente ariano garantir boas doses de decisão - ainda que a maior parte delas errada, admito -, o ponto de interrogação continua sendo o meu alvo. E a vontade de mudar, nem que seja um poltrona de um canto para outro da sala, vai batendo, batendo, batendo... até me exaurir de cansaço de tomar tanta porrada e sem nenhum efeito prático, a não ser me machucar mais e mais e mais.
Eu sei, o papo é "brabo" nesse retorno do Suburbana Copacabana, blog que criei há quase 10 anos e que durante muito tempo foi minha válvula de escape sobre a vida. O blog - ou melhor, minha inspiração - secou quando me mudei pra Santa Teresa. Achei que era sinal de amadurecimento. Que nada: foi conformismo mesmo, medo, desânimo... Foi ficar preso apenas aos aspectos práticos da vida, às contas a pagar, à preocupação de saber se vai dar pra entrar ou sair de casa em segurança - sim, amigos, tinha como vizinho o Morro dos Prazeres, e às vezes os "amigos do mal" insistiam em exibir suas armas - literalmente - em frente à minha casa. Nunca sofri nada lá. Mas vivia como se isso fosse acontecer a qualquer momento.
Mudamos e chegamos a Copa, a boa e velha Copacabana das velhinhas, das putas, dos travecos, dos michês, das famílias papai-e-mamãe, das famílias papai-e-papai - como a minha - e mamãe-e-mamãe, da solidão refletida numa mesa de pé-sujo naquela garrafa de cerveja que insiste em encher um único copo, de alguém que não tem alguém com quem conversar. E meu medo se transformou: do medo das armas que podiam atentar contra a minha vida e as das pessoas que amo para o medo da vida não estar sendo como deveria ser - ou como um dia previ, sonhei, idealizei, planejei ou simplesmente quis.
Perto dos 40? Não acredito que seja isso que me aflija. Também não descarto por completo. Só sei que tem vantagens nisso: volto a escrever sobre minhas dores, meus amores, minhas dúvidas, meus desesperos, minhas certezas. Como há 10 anos. Antes dos 30. E como quero fazer até morrer.
Beijos a todos e sejam bem-vindos a esse pedacinho do subúrbio a beira-mar.

sábado, 12 de junho de 2010

O petróleo, afinal, é de quem?



Não, não voltei após milênio para comentar a TREMENDA CAGADA que BP e cia estão fazendo no Golfo do México - que pode ser acompanhada ao vivo aqui. Minha questão é mais doméstica.

Nos últimos dias, o Senado aprovou projeto de lei do governo prevendo a "cessão onerosa" de até 5 bilhões de barris da União - ou seja, petróleo meu, seu, de todo o 'povo brasileiro', já que ainda está na rocha - para a Petrobras.

Se a Petrobras fosse 100% estatal, eu e os outros quase 200 milhões de brasileiros, em teoria - e bota teoria nisso - seríamos os seus 'donos', representados pelo Estado brasileiro. Se assim fosse, a decisão do meu representante - o governo - de ceder o meu petróleo ainda etéreo - aquele lá do fundo do mar, abaixo do sal - para a minha empresa de petróleo - a Petrobras - faria sentido, ainda que vivamos em um ambiente, em teoria - e bota teoria nisso -, concorrencial, sob o atual modelo de exploração das reservas de petróleo e gás natural do país.

Entretanto, o meu representante eleito - o governo - detém pouco menos de 40% do capital total da 'minha petroleira' - a Petrobras, afinal, sou um cidadão brasileiro, e a propaganda oficial vive dizendo que a Petrobras é de todos os brasileiros. Ou seja, o meu representante, embora tenha quase 58% das ações ordinárias da 'minha petroleira' - ou seja, ele manda -, divide os ônus e os bônus da 'minha petroleira' com privilegiados cidadãos, brasileiros ou não, que detêm diretamente um pedaço das 'minha petroleira', via ações.

Aí chegamos à minha grande dúvida: quer dizer que o meu representante, que administra os meus bens no subsolo - sou cidadão brasileiro -, está cedendo uma parte desses meus bens - o petróleo etéreo abaixo do sal - à 'minha petroleira' - a Petrobras -, da qual eu não tenho NENHUM PEDAÇO, pois não sou acionista, mas da qual alguns cidadãos brasileiros ou não detêm ações e, com isso, serão beneficiados financeiramente com a valorização dessas ações por causa da cessão do meu petróleo, como cidadão brasileiro, sobre o qual EU NÃO RECEBEREI UM TOSTÃO SEQUER?

Se alguém souber explicar melhor, desenhe. Publicarei com o maior prazer.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

EU TÔ VOLTANDO!!!!


Crianças, não precisam espernear!!! Depois de meses distante, eu tô voltando!!! Aguardem!!!!!

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Ressaca pós-eleições - pontos positivos


Gente, ok, não deu. Com feriado para o funcionalismo público antecipado, 55 mil cariocas - menos do que vai dar de gente em um dos shows da Madonna em dezembro - debandaram para o lado das "forças ocultas" e decidiram a eleição em favor do Eduardo Paes. Tudo bem... vida longa e boa administração ao novo prefeito!

Agora, apesar da ressaca sem nenhuma gota de álcool no sangue, há alguns pontos muito positivos que os eleitores de Gabeira precisam enxergar e ver que o Rio continua lindo, lindo. Podia ter sido muito, mas muito pior mesmo! E é tudo isso que pretendo lista aqui, após séculos sem escrever nesse blog.


Vamos lá:

1) Cesar Maia agora não tem apenas um ex-blog. Tem também um ex-cargo de prefeito. Olhem que maravilha!

2) A maioria dos eleitores do Gabeira não moram no mesmo prédio que o Cesar Maia. Portanto, a única chance eleitoral que, creio eu, esse quase ex-alcaide terá na vida - eleger-se síndico de prédio - não vai nos afetar! Ufa!

3) Não teremos que aturar aquelas plásticas horrendas e aquele ar de Ken mal-ajambrado do Marcelo Crivella! Quer dizer, pelo menos não à frente da prefeitura, porque atrás... bem, o senhor Paes vai nos mostrar em breve, quando escolher seu secretariado.

4) Descobrimos a verdade sobre pessoas como Jandira Feghali, Benedita da Silva e Vladimir Palmeira, até então tidos como semi-deuses de esquerda. Francamente... dias ruins deverão vir pela frente para esses senhores - o que já será uma boa vingança.

5) A Clarissa Garotinho, apesar de ter sido eleita, é apenas uma dos 51 vereadores do Rio. E Campos, cidade que será governada pela mãe da dita cuja e ex-governadora, fica a 350 km do Rio. Não é mesmo uma maravilha? Já pensaram se ela tivesse ganho a eleição em Niterói, que horror seria?

6) Nas próximas eleições, vai ter muito candidato pensando duas vezes antes de distribuir santinhos e xingar a mãe dos outros. Metade do eleitorado mostrou que não está mais a fim disso. E esse número não pode ser desprezado.

7) Apesar de ter vencido no Rio, a situação não vai ser tão fácil assim para o Sergio Cabral como se pensa. Além de ter metade da cidade desaprovando seu governo, quase todos os municípios do entorno - Baixada, Niterói e São Gonçalo - derrotaram os candidatos do governador. A resistência ao peso da máquina será grande...

Bem, por enquanto é só. Mas certamente cada um de nós, eleitores de Gabeira, do respeito, de uma nova forma, limpa, de fazer política, encontraremos mais e mais vantagens. Até mesmo a de ter perdido a eleição. Isso nos transforma em fiscais mais rigorosos do novo prefeito.

O Globo, em sua edição de hoje, publicou na capa uma lista de promessas de Paes. É hora de recortarmos isso e colarmos na porta da geladeira. É para o bem de todos. O Rio agradece.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Queridos, mas nem tanto amigos

Não sou especialista em TV para analisar esses 2 primeiros capítulos da minissérie "Queridos amigos", que a Globo vem exibindo desde ontem em um horário ingrato com o telespectador - que tem que ainda aturar a infâmia chamada "Big Brother Brasil" e os discursos pseudopoéticos do pseudojornalista e pseudopoeta Pedro Bial - e com o elenco, formado por "feras" que raramente são reunidas hoje em uma produção televisiva. Mas já considero ter algum conhecimento em outra matéria importante ali retratada: a vida e suas idas e quase-nunca vindas.

Reencontrar velhos amigos, sonhadores em fases mais jovens, inseparáveis há 10 ou 15 anos, pessoas que juravam que iriam "mudar o mundo"... nossa, que clichê! A idéia é por demais simplória, um lugar-comum que ronda ou já rondou a cabeça de todos. E é justamente nisso que, acho eu, reside o grande trunfo de "Queridos amigos". Li duas críticas sobre a série e ambas a acusavam de ser "mais do mesmo". Mas o que se esperava de um reencontro de pessoas que um dia sonharam juntas, mas que chegaram ao ponto de apenas se suportar para relembrar um tempo que passou e que nunca mais voltará?

No capítulo de ontem a bomba estourou. As diferenças, antes suportáveis, entre as pessoas apareceram na mesa e jogaram por terra o desejo-maior do amigo que organizou o reencontro: voltar a ser uma "família", como eram antes. Isso aparentemente. Na verdade, acredito que tudo transcorreu como esperado por ele. Os amores, os ódios, as diferenças, as similaridades, os sonhos frustrados, a mudança de planos, tudo estava ali porque tinha que estar. Uma grande lavagem de roupa suja. Uma roupa que não ficará limpa nunca, porque não é esse o objetivo. E mais um clichê se apresenta: é na diferença que está o aprendizado.

Senti saudade de zilhões de pessoas ontem. Até mesmo daquelas que eu odiava há 10, 15, 20 anos, com quem eu não sonhei porra nenhuma, não fiz planos, não desejei nunca mais reencontrar. Pessoas a quem odiei pelo simples fato de elas existirem e terem aparecido na minha vida. Pessoas que, por isso mesmo, me ensinaram a ser diferente delas, a agir de forma diversa ao que elas defendiam. Queria revê-las e jogar merda no ventilador, para, no fim, brindar a vida - a minha e a delas, bem longe de mim.

Também tive vontade de beijar e abraçar velhos "amigos", aqueles com quem sonhei, ri, chorei, mas que se foram no vento do dia-a-dia e da sobrevivência. Pensei em como seria hoje conversar com eles e ver que já não pensamos mais as mesmas coisas, que boa parte dos nossos idealismos foram embora pelo ralo no primeiro banho de realidade que tomamos ao iniciar a luta pelas nossas vidas. Mas que as lembranças do que um dia fomos - já não somos mais os mesmos, isso é óbvio - ainda podem nos fazer dar boas risadas a respeito do que um dia desejamos, mas que não nos diz mais respeito. Que esse desejo fique, então, como nossos filhos, sobrinhos, enteados, afilhados, sei lá mais quem. Nossos sonhos, hoje, são mais próximos do chão, e isso não é de todo ruim. E nem é de todo ruim que filhos, sobrinhos, enteados, afilhados, sei lá mais quem, sonhem próximo às nuvens. Foi lá que começamos. Mais um clichê.

Sei que toda essa vontade que me bateu ontem - e que talvez voltará a bater até o fim de "Queridos amigos" - acabará no dia seguinte ao fim da minissérie. Mas será bom nos próximos dias fechar os olhos e imaginar por onde andam os velhos "amigos" - mesmo aqueles que eram "inimigos" -, como eles estão, se estão vivos, se moram na minha cidade, se engordaram ou emagreceram, se casaram, separaram, tiveram filhos, assumiram sua homossexualidade, mudaram de religião, herdaram os negócios dos pais e prosperaram, herdaram os negócios dos pais e ruíram, construíram suas carreiras, sejam elas de sucesso ou de fracasso, fizeram plásticas para esconder as rugas que o tempo insiste em colocar na cara da gente, apesar de nosso horror a elas.

Boa parte dessas pessoas está ao meu alcance. Afinal, o orkut é um dos lugares mais clichês do mundo: lá vc reencontra pessoas que há milênios não via, inclui no seu rol de amigos e continua não as vendo, acredito que para manter a "mística do 'como será que essa pessoa está ao vivo e a cores?'" Mas, enquanto essa "lavagem de roupa suja" não sai das telas do computador - discutir relação virtualmente não é tão clichê, mas não tem a menor graça -, vou dar um beijo nos meus amigos do dia-a-dia, nos que a vida me trouxe após o "choque de realidade", e esperar aqueles que ainda estão por vir. Mesmo que sejam aqueles que um dia foram os meus queridos amigos, mas hoje não mais o são.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

A corrida

Tive muitas dúvidas em escrever hoje. Quem me conhece sabe que sou extremamente confessional nas minhas palavras escritas. E quem não me conhece, quando as lê, não desconfia que ali, na maior parte do tempo, há confissões. As letras são cifradas. Nada é claro. Levanta dúvidas. Como sou eu, o tempo todo: dúvida ad eternum.

Mas aqui, hoje, faço uma confissão direta para tentar não pirar em definitivo – somente naqueles momentos em que é preciso pirar para não ficar maluco, como disse certa vez um interno do Hospital Pinel, aqui do Rio de Janeiro, para uma grande amiga que o entrevistou: “maluco é quem não pira”.

Meu pai tem câncer. No fígado. Resultado de uma cirrose mal-tratada, causada, por sua vez, pelo excesso de bebida alcoólica. Ele tem de fazer quimioterapia e passar por todo aquele processo que todos nós sabemos como funciona. E também entrar na fila do transplante. Se ele aceitar. Porque meu pai não é fácil. Não parou de beber mesmo depois da cirrose. Não aceita a idéia de transplante. Quer morrer, embora não diga isso claramente. Há uma possibilidade de transplante entre-vivos. E pelas informações iniciais, eu seria o doador, pela compatibilidade sangüínea.

Pronto, confessei! Diretamente, sem medo. Mentira, com medo. Muito medo. Medo do amanhã. Medo de eu ser a última salvação de meu pai. Medo dos riscos que eu corro se eu for a última salvação do meu pai. Medo de fazer companhia ao meu pai no destino próximo dele. Medo do que será da minha vida após meu pai. Sem pai.

Também confessarei o extremo egoísmo que me preencheu após a notícia da doença: a passagem do bastão. Sim, a corrida passa agora por (mais) uma transição. Com a ida do meu pai, com o fim do trecho dele na corrida, eu entro no meu último trecho. É da natureza humana: nascer, crescer, reproduzir, envelhecer, morrer. Aprendemos isso no primário. Já cumpri os três primeiros verbos. Começo a entrar no penúltimo deles, para atingir, enfim, o último. E passar o bastão da “próxima vítima” para minha filha.

Claro, a vida nem sempre segue o caminho natural. Nada impede que, mesmo com o fim decretado do meu pai, o meu fim chegue antes. Vivo no Rio de Janeiro, onde viver é sempre uma grande aventura, fumo horrores, tenho tendência a hipertensão – herança genética de meu pai, aliás –, não tenho feito atividades físicas e não sei se tenho um aneurisma prestes a explodir na minha cabeça a qualquer momento. Posso terminar esse texto e ir. Posso durar até os 100. E – para mim, o pior dos mundos –, Deus pode me fazer uma surpresa e encerrar a corrida da minha filha antes da minha expirar. Mas isso faz parte das surpresas. Não há como se preparar. Mas para a natureza, sim. Sabemos onde chegaremos. No fim. Naturalmente.

Por tudo isso, também me aterroriza a idéia de que o bastão passa em definitivo para as minhas mãos. Com a saída de meu pai do jogo, resto eu. Eu como o último corredor na minha corrida-vida, aquele que levanta o estádio na expectativa de ganhar uma medalha, ou melhor, de ganhar o tempo e estender a distância até o máximo possível, para, enfim, diminuir o ritmo e passar o bastão para o próximo corredor. Colocar as mãos nos joelhos e soltar o último suspiro. E ir para o vestiário.

Confesso que mais que a perda de meu pai, que sempre considerei um caminho natural, apesar do vácuo que ficará na minha vida, dói mais a idéia de que meu fim vai também chegando. E eu não quero isso. Terei de me acostumar. E continuar correndo. Até começar a ver a minha filha adiante, na curva da pista, pronta para pegar o bastão. E seguir para o vestiário. Essa é a vida. Mas que dói, dói.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Acerca

As árvores estão amareladas

Falta chuva, que não cai

Água que não sai dos meus olhos

Água que me afoga por ausência

Ele está ali, braços abertos

A maravilha, um entre sete, Ele

Dizendo “meu filho, cá venha

Aqui há alento, carinho

Sossego para sua demência”

Amarelo, quase árido

Olho seco, cerca de lágrimas

Me segura dentro disso aqui

Certo que sim

É o fim

Ele, a maravilha, a acolher

“Filho meu, cá estou

Afagos a te esperar

Palavras a te aguardar

Sopro para sua falta de ar”

Árvores nada verdes, ácidas

Feridas amarelas, plácidas

Meu filho, filho meu

Fim da linha, o breu

A cerca. Preso. Presa.

Adeus.